quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Eu entendo a Fernanda Lima

O controle está do outro lado da tela.
Por Jotha Santos
Quando a apresentadora Fernanda Lima declarou: “É muito difícil fazer esse programa. A minha profissão nunca foi criadora de formato, roteirista, e escrever esse programa é muito difícil. O processo criativo é de um sofrimento terrível pra mim...”, eu entendi o que ela quis dizer. É complicado mesmo tentar fazer coisas as quais não temos inclinação, destreza e liberdade. E não é culpa dela. Processos criativos e de conteúdo são naturalmente complexos e labirínticos, principalmente em um momento em que idealistas e ideologias condicionam a onipresença de seus discursos sorrateiros. E isto sempre existiu. Tentar fazer algo de qualidade e digno de aplausos, neste cenário, é quase sempre uma tarefa hercúlea.

Lembro-me uma vez quando trabalhei como repórter policial no interior de São Paulo. Eu sabia fazer aquilo. Era minha praia. Foi então que a editora me pediu para cobrir as férias da repórter da editoria de Política. Eu não conhecia aquele mundo, mal entendia a linguagem daquela turma e não me sentia nenhum pouco a vontade entre homens engravatados e mulheres de meias-calças. Para piorar, quando chegava à redação, o texto empacava, a narrativa era medíocre e finalizar uma única pauta diária era um tormento. Foi um desastre.

Não posso comentar aqui especificamente sobre o conteúdo do programa de Fernanda Lima. A atração chega ao seu final sem que eu a tenha visto, mas entendo o momento pelo qual a esposa do Rodrigo “Mr. Maravilha” Hilbert está passando. Quando algo que fazemos e nos dedicamos torna-se um sofrimento, é hora de repensar. No lugar dela eu faria o mesmo, ainda que concordasse (ou não) com os ideais e princípios da “família Marinho”, como ela aparentemente concorda e reproduz. Tudo isso passa a ser irrelevante no momento em que tais valores, independentemente do conteúdo, já não são mais transmitidos de forma natural, ética, pertinente e com qualidade criativa. E se o trabalho passa a ser um torturante calvário, difícil será encontrar nele algum predicado. O melhor mesmo é ponderar. Ela tem talento e vocação inquestionáveis, mas talvez seja esta a oportunidade de um novo direcionamento. Um recomeço.

Antes de voltar para o conforto das delegacias, tiroteios, assassinatos, suicídios e textos explosivos, recebi algumas críticas pelo trabalho na editoria de Política. Chegaram a ligar na redação para reclamar, pois algo estava muito “diferente”. Até o prefeito protestou! As críticas são assim e elas também determinam em quais águas podemos navegar. As de Fernanda Lima me pareciam muito perigosas; pelo tema, por suas convicções e pela forma como conduziu seu trabalho naquele cargueiro de caprichos e vaidades chamado Rede Globo. Pelo que li, a audiência caiu, a desaprovação foi brutal e a medida mais razoável foi decretar o fim da atração.

Segundo Fernanda Lima, “Amor & Sexo”, também a afastava de casa, dos filhos e do marido, deixando tudo ainda mais complicado, afinal, quem é que consegue ficar muito tempo longe do homem mais espetacular, esplêndido e sensacional que a natureza uma vez criou?

Uma pausa para reflexão talvez seja uma boa ideia para ela neste momento. Vai curtir a natureza, os pequenos e o super marido. Comer carne de crocodilo caçado, limpo e preparado por ele. Dormir em engenhosas cabanas improvisadas na selva com água encanada e eletricidade igualmente fornecidas por ele. Vai ali contar uma piada, assistir filmes, jogar vídeo-game, andar de bicicleta e nadar pelada no rio. Comer brigadeiro, milho assado e cachorro-quente. Vai ali ler um bom livro, escrever anedotas, contos de amor e ouvir uma boa música. Faz bem para a alma e o coração. Volte renovada e faça algo que traga contentamento, não necessariamente para os outros. Faça tudo de forma genuína, mas sem forçar a barra, pois ela pode se dobrar e, por fim, se quebrar. Só não vai ali ouvir o Rodrigo Hilbert cantando no comercial da Tim, pois isso pode não ser assim tão salutar, afinal, até ele tem limites.

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