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segunda-feira, 17 de agosto de 2020

A Mosca de Banheiro - Parte III

Cadê a Greta nessas horas?
Se a Greta lutasse mais pelas verdadeiras causas...
Por Jotha Santos
Antes que meus caríssimos leitores pensem que eu tenho algum tipo de fixação por moscas de banheiro, afirmo categoricamente que não. Não é isso (ou talvez tenha e não queira admitir)!  O fato é que, em um dia qualquer de quarentena compulsória do estranho ano de 2020, o tema brotou novamente como um caroço de feijão no ouvido e tornou-se o assunto mais comentado do Twitter na ocasião. E eu juro que não estava procurando nada sobre. Deve ser algo como aqueles sonhos que nos perseguem a vida inteira e a gente nunca consegue se livrar, ou parte das minhas alucinações dípteras psicodídeas já relatadas em textos anteriores.

É fato que muitas pessoas ainda desprezam a pobre mosquinha de banheiro e isso me incomoda. Desprezam mais do que dinheiro falso, fita K7 do Menudo e frases da Dilma. Mal sabem a utilidade dessas criaturas aladas para o equilíbrio e manutenção da nossa fauna sanitária. E é lá no banheiro que elas jogam em casa. Se você alguma vez observar uma delas fora do seu habitat natural (na sala de estar, por exemplo), faça uma boa ação: Imagine-a como uma tartaruga perdida do Projeto Tamar (o nível de importância é equivalente) e conduza-a cuidadosamente ao ralo mais próximo em seu WC.

Se a Greta Thumberg lutasse mais pelas causas dessas singelas entidades felpudas que habitam a casinha, o mundo seria melhor. Quantas delas você abateu só hoje em seu ligeiro banho matinal? Quantas vidas você eliminou borrifando Mr. Músculo em suas diminutas larvas? Larvas que jamais poderão experimentar a metamorfose da vida, ainda que curta. Outro dia eu li que jogar água fervente em ralos e rejuntes pode auxiliar no extermínio das pobres coitadas. Cadê a Greta nessas horas?

Uma mosca de banheiro vive apenas uns 15 dias, ou seja, menos tempo do que você levaria para programar um videocassete ou aprender inglês na Open English. Parece pouco, mas neste efêmero ciclo de vida, ela faz muito por você. Apesar de não voar lá muito bem (daí o motivo de sua fácil captura e matança desenfreada), os acanhados insetos do gênero Psychoda são seus maiores aliados na preservação e salubridade de sua casa de banho (entre outras coisas). Eles se alimentam de restos, inclusive os seus! Pele, pelos, cabelos e outros materiais orgânicos desenvolvem bactérias que servem de refeição para os pequenos odiados (muito mais do que oito, dependendo da pujança aplicada na limpeza do seu WC). Limo, bolores e fungos contidos em azulejos e ralos são como um banquete romano.

Apesar de carregar consigo a obscura denominação “mosca”, sua melhor ouvinte em momentos de cantoria no chuveiro é completamente inofensiva. Não transmite nenhum tipo de doença, não suga seu sangue como o Conde Drácula e é incapaz de desferir uma única picada. A mosca de banheiro jamais aferroa as mãos de quem a alimenta. Disciplinada, é quase impossível encontrá-la, por exemplo, em sua cozinha, o que poderia causar certo desconforto, muito embora o setor gastronômico do seu lar tenha o ambiente propício para o surgimento de coisas bem mais repulsivas. Uma mosca de banheiro existe apenas para colaborar com o ecossistema sanitário de sua latrina, tão bem decorada com capinhas e tapetes de crochê feitos pela sua avó em 1984. Deveria se chamar “Borboleta de Toalete”, algo muito mais poético e digno de sua nobre função.

Eu entendo que se a população de psychodas estiver crescendo exponencialmente a ponto de incomodar as visitas, é conveniente realizar algum tipo de intervenção. Mas vá com calma. Troca de sifões, telas nos ralos, litros de Qboa e água fervendo uma vez por semana podem ser soluções drásticas demais e você será o único responsável pela iminente extinção desse simpático espécime, pelo menos em sua casa. Um recurso rápido, eficaz e indolor consiste em usar uma raquete elétrica - daquelas vendidas em semáforos - a fim de eliminar apenas o excedente. Descarte os corpos rapidamente. Comprar um sapo e criar aranhas também ajudam.

Logo mais, ao adentrar seu sanitário para atividades de cunho íntimo e que não dizem respeito a mais ninguém, olhe, contemple e reflita sobre aquelas singulares criaturas. Elas só querem um pedacinho de azulejo, uma fresta de rejunte, um ralo para preservação da espécie e um bocadinho de microrganismos naturalmente fornecidos por você. Em troca, te ajudam na limpeza profunda sem reclamar, fazer greve, picar, invadir outros cômodos, transmitir alguma moléstia bizarra e, principalmente, sem zumbir no seu ouvido de madrugada acabando com o seu sono. Salve a mosca de banheiro!

Foto: https://www.semanticscholar.org/paper/Predatory-Activity-of-Psychoda-alternata-Say-(-%3A-)-Bardicy/bf62a2b47be0ea8ee1b595e21d3d5acb9be2d6d9

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